quinta-feira, julho 19, 2012

As Fronteiras entre o Público e o Privado no Ciberespaço: Uma Discussão sobre a Privacidade nas Redes Sociais

Estive nos últimos dias escrevendo sobre os conceitos de público, privado, privacidade e redes sociais relacionando-os com o comportamento da geração digital, nos dias de hoje. Na verdade, procurei relacionar os textos indicados para leitura nas disciplinas de doutorado “A Estética das Redes e o Ciberespaço” e "Modernidade Líquida", do PPGIE – UFRGS, no período letivo de 2012-1, que foram ministradas pelas professoras Maria Cristina Biazus, com a colaboração do pós-doutorando Rafael Wild, e professora Marie Jane Soares Carvalho, com a colaboração da pós-doutoranda Nádie Christina Machado-Spence, respectivamente. 

A ideia inicial do texto foi fazer uma reflexão sobre o conceito do que é público e privado e a sua relação com o conceito de privacidade no contexto das redes sociais. Estas reflexões foram feitas a partir de discussões em sala de aula e por meio da rede social Facebook, com os colegas da disciplina. 


Inicialmente, decidimos assistir o filme Violação de Privacidade[1] (The Final Cut) para ser o ponto inicial das discussões e por ter uma relação "homem-máquina".

O filme, escrito e dirigido por Omar Naim e estrelado por Robin Williams em 2004, tem como tema central a implantação de microchips no cérebro de algumas pessoas e que registram todos os momentos de sua vida. Os chips – comercializados como Zoe Chips - são removidos após a morte do seu portador e as imagens editadas por um especialista – o editor. Esse profissional tem como responsabilidade editar as memórias e lembranças registradas no chip, visando a produção de um filme que será exibido durante a cerimônia do funeral. O personagem vivido por Robin Williams é um dos maiores especialistas nesse tipo de edição, selecionando imagens que tornam as memórias da pessoa falecida em histórias imaculadas, livres de pecados, dissabores, violências ou aspectos que poderiam denegrir suas imagens.


A partir do filme foram sugeridas algumas palavras-chave para os  estudos, como: ciborg, chip, edição, subjetividade, representação, imagem, leitura, ética, público e privado. Estes conceitos podem ser vistos no portal Final Cut


Ana
lisando o filme, compreende-se que os conceitos de edição e editor ocupam uma posição importante e central nas reflexões em função da noção de ação associada a isso, pois é a partir da interpretação do editor e de seu olhar que se baseiam as escolhas feitas na sua leitura para a construção dos filmes retratando as memórias dos portadores dos chips. Da mesma forma, esse texto é construído a partir do olhar da autora que elegeu os conceitos “público e privado” que se integram na evolução do filme. 


A partir da escolha dos conceitos de “público e privado”, foi realizada uma pesquisa bibliográfica centrada nestas palavras-chave, que foram analisadas a partir da narrativa do filme. O filme é um simulacro do que o homem pode idealizar em sua ação com a máquina. Assim, com o uso de tecnologias, como máquinas fotográficas, filmadoras, ou como propõe o filme, um chip implantado em uma pessoa, é possível saber todas as experiências vividas, sejam estas experiências boas ou não.

Com o objetivo de sistematizar as discussões, organizou-se um mapa conceitual, utilizando o CmapTools (software livre de edição de mapas conceituais) que foi o norteador para as reflexões em questão.  A Figura 1 mostra este mapa conceitual com todos os conceitos discutidos pelo grupo e apresenta a ideia de que a “edição invade o que é público e privado”.



Figura 1 - Mapa conceitual relacionando os conceitos encontrados no filme.

Isso nos leva a associar a viabilidade de um chip que pode filmar ou gravar a vida “vivida”, sendo depois possível “construí-la” ou “reconstruí-la” a partir do processo de edição realizado por uma pessoa externa, como um exemplo do que Lévy (2009) propõe como movimento de virtualização. O autor descreve esse movimento como o “Efeito Moebius, ou a inversão entre externo e interno, privado e público, próprio e comum” (p.24-25]. Lévy (op cit) desmistifica a oposição entre o real e o virtual. Para ele, a virtualização não se dá apenas dentro de máquinas computacionais. O virtual existe de forma potencial, pois “quando uma pessoa, uma coletividade, um ato, uma informação se virtualizam, eles se tornam ‘não-presentes’, se desterritorializam” (op cit, p.21).

É nesse contexto que o filme nos aponta a possibilidade de a vida de uma pessoa ser editada por um terceiro, sendo que essa edição passa pela subjetividade do olhar do editor em sua “especialidade profissional” que é selecionar e decidir o que será “publicado” da vida do outro no memorial que está sob sua responsabilidade. Provocados por essa questão, o grupo de colegas da disciplina, desenvolveu um trabalho colaborativo e cooperativo, tecendo cada um a sua própria leitura sobre o filme com as respectivas áreas de conhecimento, tendo-se assim um rizoma composto dos diferentes olhares dos cinco integrantes do grupo.

Neste texto são discutidos os conceitos de “público e privado”, relacionando-os com o conceito de “privacidade” nas “redes sociais”, tendo como fundamentação teórica, os postulados de Zygmunt Bauman.



A estrutura deste texto está organizada da seguinte forma:

- a Seção 2 apresenta uma reflexão sobre o conceito de “redes sociais” no ciberespaço;

- a Seção 3 discute os conceitos de “público, privado e privacidade” nas redes sociais;

- a Seção 4 traz as considerações finais com o olhar da autora; e por último, 

- as Referências Bibliográficas consultadas para a escrita do texto.


2.  As Redes Sociais e o Ciberespaço

O conceito de “redes” tem sido formulado em diferentes áreas do conhecimento a partir de metáforas que lembram encadeamentos, interações, associações, vínculos não lineares, todos envolvendo relações de comunicação de informações. Segundo (Aguiar, 2007), os diversos padrões de formação de redes de indivíduos e grupos sociais começaram a ser estudados a partir da década de 1940, sobretudo por sociólogos, antropólogos e psicólogos sociais dos EUA, Inglaterra e Alemanha (Barnes, 1972; Rogers e Kincaid, 1981; Scott, 1992; apud Aguiar, 2002), que utilizaram diferentes metáforas (malha, trama, árvore, teia) para descrever os padrões de conexão e de fluxo de informações entre os nós, até chegar à complexidade de um rizoma (Deleuze e Guattari, 1996, apud Aguiar, 2002).

No Brasil, as redes sociais passaram a despertar interesse acadêmico nos anos 1990, nas pesquisas sobre novas formas associativas e organizativas que emergiram dos processos de resistência à ditadura militar, de redemocratização do país, de globalização da economia e de proposição do desenvolvimento sustentável (Aguiar, 2006) e (Aguiar, 2007).

Para (Marteleto, 2010), redes sociais é um conceito onipresente nos dias de hoje e ocupa espaço crescente no discurso acadêmico, nas mídias, nas organizações ou no senso comum. As redes sociais servem para dois fins. Primeiro, organizar o espaço de comunicação e interação no mundo globalizado e interconectado, no qual se produzem formas diferentes de ações coletivas, de expressão de identidades, de conhecimentos e de informações. Segundo, mostrar mudanças no modo de comunicação e interação entre as pessoas, na forma de como as pessoas se socializam, se conhecem, como aprendem, escrevem e como forma de fonte do conhecimento globalizado.

Nas ciências sociais, os estudos de redes sociais permitiram a construção de uma compreensão inovadora da sociedade, que ultrapassa os princípios tradicionais, nos quais o elo social é visto como algo que se estabelece em função dos papéis instituídos e das funções que lhes correspondem. De forma diferente, o conceito de redes sociais leva a uma compreensão da sociedade a partir dos vínculos relacionais entre os indivíduos, os quais reforçariam suas capacidades de atuação, compartilhamento, aprendizagem, captação de recursos e mobilização (Aguiar, 2006).

Pode-se observar que as redes sociais representam as relações entre pessoas, que podem estar interagindo por interesse próprio ou em nome de uma instituição, mediadas ou não por computador. Observa-se, também que as redes sociais são formadas com objetivos específicos, isto é, por pessoas que articulam outras pessoas em torno de interesses, projetos e objetivos comuns.

Uma estrutura em rede – que é uma alternativa à estrutura piramidal – corresponde também ao que seu próprio nome indica: seus integrantes se ligam horizontalmente a todos os demais, diretamente ou através dos que os cercam. O conjunto resultante é como uma malha de múltiplos fios, que pode se espalhar indefinidamente para todos os lados, sem que nenhum dos seus nós possa ser considerado principal ou central, nem representante dos demais. Não há um “chefe”, o que há é uma vontade coletiva de realizar determinado objetivo. (Whitaker, 1993 apud Aguiar, 2006).


2.1 Metáforas das Redes Sociais

Uma questão fundamental na análise de redes é a forma como a informação flui entre os integrantes destas redes e a força das interações entre eles, que têm sido comumente representados por meio de quatro metáforas: árvore, malha ou trama, teia e rizoma (Aguiar, 2006).

O conceito de Rizoma foi a metáfora de redes escolhida por esta autora para ser comentada neste texto. Segundo (Aguiar, 2006), o Rizoma é a metáfora que tenta dar conta de uma multiplicidade de relações assimétricas de comunicação, desencadeadas em vários pontos simultaneamente, e de fluxos descentralizados e não-regulares de informação (no tempo e no espaço), nos quais não é possível identificar um ponto “gerador” único. Um rizoma caracteriza-se pela multidirecionalidade: o fluxo de informações pode partir de qualquer ponto, ou de vários, e qualquer pessoa pode enviar mensagens para quem quiser, ou para todos, simultaneamente; os papéis de emissor e receptor são intercambiáveis; e a circulação de informação por toda a rede independe de uma instância central. Caracteriza-se também pela heterogeneidade dos seus nós e vínculos: relações e sentidos são estabelecidos de modos muito diversos, e o rompimento de um ponto qualquer das cadeias de comunicação não compromete o reconhecimento do todo; rupturas, “linhas de fuga” e mecanismos de auto-reorganização são próprios da sua dinâmica. Um rizoma é tipicamente a configuração das conexões interpessoais estabelecidas na vida cotidiana e via Internet. [...] Qualquer pessoa pode contatar certos indivíduos e ignorar muitos outros; ou comunicar-se mais intensamente com uns do que com outros; ou seja, pode manter vínculos fortes ou fracos, recíprocos e não-recíprocos. Vínculos fortes podem ser intensos, duradouros; e vínculos “fracos” não significam, necessariamente, comunicação menos eficaz ou menos relevante.

Diferentemente de “relações”, “parentescos”, “parcerias” e noções similares – que ressaltam o engajamento mútuo ao mesmo tempo em que silenciosamente excluem ou omitem o seu oposto, a falta de compromisso – uma “rede” serve de matriz tanto para conectar quanto para desconectar; não é possível imaginá-la sem as duas possibilidades. Na rede, elas são escolhas igualmente legítimas, gozam do mesmo status e têm importância idêntica. Não faz sentido perguntar qual dessas atividades complementares constitui “sua essência”.  A palavra “rede” sugere momentos nos quais “se está em contato” intercalados por períodos de movimentação a esmo. Nela as conexões são estabelecidas e cortadas por escolha. A hipótese de um relacionamento “indesejável, mas impossível de romper” é o que torna “relacionar-se” a coisa mais traiçoeira que se possa imaginar. Mas uma “conexão indesejável” é um paradoxo. As conexões podem ser rompidas, e o são, muito antes que se comece a detestá-las. (Bauman, 2004, p.12)

3. O Público e o Privado nas Redes Sociais
A imagem (Figura 2) selecionada do filme Violação de Privacidade (2004), para representar o “público e o privado”, mostra o editor sendo agredido pela população após manifestações contra os implantes de chip em bebês recém-nascidos, chamados de implantes Zoe. Estas manifestações acontecem pelo fato de que o editor mascara a realidade, selecionando apenas as imagens que ele considera como as mais adequadas, politicamente corretas e felizes, para montar outro filme, que será mostrado às pessoas presentes no cerimonial fúnebre, chamado de rememória. 

Figura 2 - Imagem do filme Violação de Privacidade (2004).



No contexto da obra cinematográfica Violação da Privacidade (2004), a questão do que é público e do que é privado, consiste em refletir sobre até que ponto o editor ou a própria família, tem o direito de mostrar na esfera pública, parte da vida privada, até então considerada como parte íntima do falecido. E, por que usar uma ferramenta de edição para mostrar apenas o que é politicamente correto, bonito, feliz e aceitável publicamente ?


No entanto, é importante questionar-se sobre o que, realmente, é da ordem do privado. Sabe-se que o que é privado é “algo” que pertence ao domínio da “privacidade” e, consequentemente, é tudo o que não é público. Segundo o dicionário Aurélio, “privacidade” é a habilidade de uma pessoa em controlar a exposição e a disponibilidade de informações acerca de si. Relaciona-se com a capacidade de existir na sociedade de forma anônima.  No caso do filme em questão, o falecido não tem gerência sobre as suas memórias, simplesmente pelo fato de que não tem o conhecimento de que é portador de um implante Zoe, e assim sendo, não tem como gerenciar esta situação, nem tão pouco, solicitar edições do filme da sua vida privada para torná-la pública.


No contexto das redes sociais, amplamente utilizadas pela nova geração, chamada de geração digital (Tapscott, 2010), a questão do que é público e do que é privado, está em discussão no contexto escolar, e preocupa pais e professores. Isto porque mais de 5 milhões de estudantes brasileiros já pertencem a uma rede social na internet, como o Facebook ou o Twitter. As redes sociais na internet fazem parte da vida da geração digital. No entanto, sabe-se que as coisas têm o seu lado positivo e outro lado negativo.

O lado positivo é que, a participação ativa nas redes sociais, está colaborando na preparação dessa geração para os desafios da economia digital, que requer habilidades de pensamento completamente diferentes das que eram necessárias na Era Industrial (Castells, 1999). O sociólogo polonês Zygmunt Bauman (Bauman, 2011a), também apresenta reflexões importantes sobre o mundo pós-moderno e a condição social, na qual estamos inseridos, e que tem referência com o fato de não vivermos mais na Era Industrial e, estarmos vivendo na Era do Conhecimento:


O que aconteceu no século XX foi uma passagem de toda uma era da história mundial, ou seja, da sociedade de produção para a sociedade de consumo. Por outro lado, houve os processos de fragmentação da vida humana. [...] No início deste século, as pessoas se preocupavam com o projeto de vida, e em executá-lo, passo a passo. Nos dias atuais, isto não acontece, porque a vida é dividida em episódios, fragmentados, o que não era assim no início do século XX. As sociedades foram individualizadas. Em vez de se pensar em termos de a qual comunidade se pertence, a qual nação se pertence, a qual movimento político se pertence, etc., tentamos redefinir o significado de vida, o propósito de vida, a felicidade na vida, para o que está acontecendo com a própria pessoa, as questões da identidade que têm um papel importante hoje, no mundo. A pessoa tem que criar a sua própria identidade. A pessoa não a herda. Não apenas é necessário fazer isso desde o início da vida, mas é necessário passar a vida de fato, redefinindo a própria identidade. [...] Muitas mudanças, não apenas a passagem do totalitarismo para a democracia, mas muitas outras coisas mudaram (Bauman, 2011a).


Desde as últimas décadas do século XX, estamos assistindo a diversas, rápidas, amplas e profundas transformações sociais, econômicas, culturais em âmbito mundial. Nos textos desenvolvidos por Bauman (2001, 2004, 2010, 2011, 2011a), estamos passando do que o autor chama de “modernidade sólida” para a “modernidade líquida”. A modernidade sólida, segundo ele, derretia os sólidos para colocar outros melhores em seus lugares. Essas substituições terminariam quando os sólidos ali substituídos não tivessem mais problemas, atingindo assim a perfeição. A modernidade líquida derreteu tudo o que era ou parecia ser sólido, mas não coloca outro sólido em seu lugar. Assim, tem-se a constante mudança, num processo que não tem previsão de terminar. A impermanência das coisas, torna-se a única constante da modernidade líquida. 

“Os sólidos suprimem o tempo; para os líquidos, ao contrário, o tempo é que importa” (Bauman, 2001, p.8 apud Veiga-Neto, 2009). As ideias de Bauman nos proporcionam subsídios para compreendermos, em parte, as mudanças sociais que vivemos nas últimas décadas. Estas mudanças aconteceram de forma muito rápida e com tal profundidade num amplo conjunto de práticas da sociedade pós-moderna. Tais práticas envolvem conhecimentos em diversas áreas: cultura, economia, política, ética, estética, educação, entre outras.


Considerando as ideias apresentadas por Bauman, na área da educação, o lado negativo de todas estas mudanças é a exposição da vida privada da geração digital, nas redes sociais, por meio de fotos, comentários, vídeos, entre outros, completamente sem critérios. Nesse sentido, a preocupação de pais e professores está relacionada ao “o que” os estudantes compartilham nas redes sociais, que muitas vezes são informações do âmbito privado que estão sendo disponibilizadas na esfera pública, sem critério algum.


A discussão em torno dos conceitos do que é “público e privado” é importante, e também relevante, quando percebe-se que a sociedade pós-moderna, na qual estamos inseridos, vive o momento da modernidade líquida (Bauman, 2010), onde tudo é passageiro, efêmero e muda de forma rápida, sob a menor pressão. Na verdade, a geração digital é incapaz de manter a mesma forma por muito tempo. Então, o que hoje é privado amanhã passa a ser público e vice e versa.  Mas como decidir o que pode tornar-se público ou o que deve manter-se privado ? O impulso para transgredir, substituir, trocar, acelerar, não permite a solidificação das coisas.


Outra preocupação dos educadores, tem relação com o chamado “enfraquecimento das relações humanas” (Bauman, 2004), quando observa-se que a quantidade de amigos nas redes sociais aumenta a cada dia. No entanto, da mesma forma que esse número aumenta, também ficou mais fácil e rápido “excluir” um amigo desta rede que já não é mais tão querido. 

Pode-se observar que, as escolas que estão aderindo ao uso das redes sociais, têm preferência pelo uso do microblog Twitter, simplesmente pelo fato de preservar, ao menos em parte, a “privacidade” dos estudantes. Outra preocupação pertinente no uso das redes sociais, é de ordem pedagógica, no que diz respeito ao tipo de “linguagem” que os estudantes tendem a usar na rede, bem distante da norma culta. Não é fácil estimulá-los a empregar o bom português nesse contexto, mas é importante que pais e professores estejam atentos lembrando sempre a importância da “linguagem” escrita de forma correta, mesmo nas redes sociais.


Levando em conta que o grau de exposição da informação privada depende de como o público receberá tal informação, o que varia segundo lugares e épocas, o esforço para manter um assunto privado e a decisão de torná-lo público são objetivos antagônicos. As definições de privacidade e publicidade se opõem. Privado e público são conceitos antagônicos (Bauman, 2011. p. 35-38). Em geral, seus campos semânticos não estão separados por limites que permitam o tráfego de mão dupla, mas por fronteiras demarcadas: linhas intransponíveis, de preferência fechadas com rigidez e pesadamente fortificadas de ambos os lados para impedir transgressões, isto é, que se evite passar da esfera pública para a esfera privada com muita facilidade. Parece-nos que a crise atual da privacidade está bastante ligada ao enfraquecimento, à desintegração e à decadência de todas as relações humanas. Nesse processo, é muito difícil perceber quem veio antes, se a crise atual da privacidade ou a desintegração das relações humanas.


3. Considerações Finais

As redes sociais têm sido amplamente utilizadas entre a geração digital. Estas ferramentas de comunicação aproximam as pessoas, inicialmente, motivadas pela diversão, compartilhamento de fotos e mensagens. No entanto, constata-se que o uso das redes sociais na educação tem benefícios que podem ser observados em pesquisas científicas e trabalhos acadêmicos.

Muitas escolas já usam as redes sociais e criam sites próprios para conectar estudantes e professores. No entanto, as redes sociais costumam ser consideradas inimigas dos estudos por muitas pessoas. Por outro lado, as escolas estão usando-as como aliadas na preparação dos estudantes e na comunicação entre a comunidade acadêmica.

Toda mudança de comportamento na sociedade tem os seus prós e contras. Da mesma forma que aproxima, facilita e agiliza a comunicação entre os estudantes, educadores e amigos, as redes sociais também são utilizadas indiscriminadamente, principalmente, pelos jovens que pertencem à chamada geração digital.

Observa-se que estes jovens não se preocupam com o conteúdo das mensagens nas redes sociais, e também, da mesma forma que com muita facilidade adicionam “milhares” de amigos aos seus perfis, a exclusão dos amigos já não mais queridos, é feita com mais facilidade ainda.

Isso faz-nos pensar no momento histórico em que estamos vivendo, onde tudo é descartável em nossas vidas, desde objetos, pessoas, instituições, caracterizando a liquidez da sociedade pós-moderna.

Outro ponto importante a ser considerado é a exposição dos jovens nas redes sociais, feita muitas vezes, sem critério algum do que pode ser compartilhado, ou não. Por isso, é muito importante, que pais e educadores, orientem estes jovens para o uso criterioso das redes sociais, a fim de protegê-los desta exposição inadequada nas redes, e também para auxiliá-los a fazer o uso pedagógico destas ferramentas. Outro ponto contra das redes sociais, é o uso indevido destas redes pela imprensa sensacionalista que publica fotos e informações privadas de pessoas públicas, as chamadas celebridades. Isto mostra uma preocupação a ser considerada no momento em que informações do âmbito privado se transformam em público e notório. Tudo isso, acontece pela má utilização da internet e das redes sociais. 

Inevitavelmente, tudo gira em torno da devida conscientização da geração digital para o uso adequado das novas tecnologias. Essa questão da conscientização não se resume ao fato de “os fins justificarem os meios”, como afirmava Maquiavel no seu livro intitulado O Príncipe, mas na construção de uma consciência para o uso desses meios de comunicação.

Daí, temos algumas questões para se pensar: “Como decidir entre o que é público e/ou privado?”, e “Como utilizar as redes sociais de forma que não prejudique a mim e aos  outros ?”

O filme Violação de Privacidade (2004) foi o ponto inicial para a escrita deste artigo, que desencadeou as discussões que surgiram posteriormente, em relação aos conceitos do que é público e privado, do que podemos ou não, se temos o direito de publicar dados, fotos e informações de outrem sem o consentimento do mesmo.

Responder a estas questões não foi o objetivo principal deste artigo, mas colocar-nos a pensar sobre as mesmas e de que forma, orientaremos nossos filhos e estudantes, no processo de construção do conhecimento com o uso das tecnologias de forma segura e coerente.

Para a finalização deste texto, foram consultados diversos textos, de vários autores relacionados nas referências bibliográficas e nas aulas das disciplinas.
Referências

Agamben, Go. (1999) O Novo Êxodo, In Lugar Comum nº 7, janeiro/abril de 1999, Rio de Janeiro, Ed. Fundação José Bonifácio.

Aguiar, S. R. (2002) Produção compartilhada e socialização do conhecimento em rede: uma abordagem exploratória. II Seminário Nacional do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFF – Produção do Conhecimento e Educação: História, Utopias. Niterói: UFF.

_______. (2006) Redes sociais e tecnologias digitais de informação e comunicação no Brasil (1996-2006). Relatório de pesquisa. Rio de Janeiro: Nupef, 2006.

_______.  (2007a) Formas de organização e enredamento para ações sociopolíticas. Informação & Informação, Universidade Estadual de Londrina, Vol. 12, Edição especial. Disponível no site: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/informacao/article/view/1776, com acesso em 16 jul 2012.

________. (2007) Redes sociais na internet: desafios à pesquisa. Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XXX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, Santos-SP.

Castells, M. (1999) A sociedade em rede. São Paula: Paz e Terra, 1999.

Bauman, Z. (2001) Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.

_________. ( 2004) Amor líquido. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.

_________. (2010) Capitalismo Parasitário. Tradução Eliana Aguiar. – Rio de Janeiro: Zahar.

_________. (2011) 44 Cartas do Mundo Líquido Moderno. Tradução Vera Pereira. – Rio de Janeiro: Zahar.

_________. (2011a) Fronteiras do Pensamento. Edição 2011. Entrevista com o filósofo polonês Zygmunt Bauman para o Fronteiras do Pensamento, apresentada na ocasião do encontro com o pensador francês Edgar Morin, em 08/08/2011, Porto Alegre-RS, com acesso em 18 jul 2012.

Haraway, D. (1991) Simians, Cyborgs and Women –The Reinvention of Nature, New York, Routledge, p. 62.

Lévy, P. (2009) O que é o Virtual. Trad. de Paulo Neves. São Paulo: Ed. 34, 9ª reimpressão.

Manovich, L. (2012) How to compare one million images? In David Berry, ed.Understanding Digital Humanities (Palgrave, 2012).

Marteleto, R. M. (2010) Redes Sociais, Mediação e Apropriação de  Informações: situando campos, objetos e conceitos na pesquisa em Ciência da Informação. Pesq. bras. ci. inf., Brasília, v.3, n.1,p.27-46, jan./dez. 2010.

Morin, E. (2000) A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.

Veiga-Neto, A. ; Saraiva, K. (2009) Modernidade Líquida, Capitalismo Cognitivo e Educação Contemporânea. Educação e Realidade, v. 34, p. 187-204.

Santaella, L. (2003) Culturas e artes do pós-humano: da cultura das mídias à cibercultura. São Paulo: Paulus.

Tapscottt, D. (2010) A hora da geração digital. Como os jovens que cresceram usando a internet estão mudando tudo, das empresas aos governos. Tradução de Marcello Lino. Rio de Janeiro: Agir Negócios.

Tucherman, I. (2002) Entre anjos e cyborgs. In Revista Comunicação e Linguagens, 28, Lisboa, v.1, n.1, pag. 55-69.

Whitaker, F. Rede, uma estrutura alternativa de organização. Revista Mutações Sociais, v.2, n.3, p.1-7, mar./mai. 1993.