Estive nos últimos dias escrevendo sobre os conceitos de público, privado, privacidade e redes sociais relacionando-os com o comportamento da geração digital, nos dias de hoje. Na verdade, procurei relacionar os textos indicados para leitura nas disciplinas de doutorado
“A Estética das Redes e o Ciberespaço” e "Modernidade Líquida", do PPGIE – UFRGS, no período letivo de 2012-1, que foram ministradas pelas professoras Maria Cristina Biazus, com a colaboração do
pós-doutorando Rafael Wild, e professora Marie Jane Soares Carvalho, com a colaboração da pós-doutoranda Nádie Christina Machado-Spence, respectivamente.
A ideia inicial do texto foi fazer uma reflexão sobre o conceito do que é público e privado e a sua relação com o conceito de privacidade no contexto das redes sociais. Estas reflexões foram feitas a partir de discussões em sala de aula e por meio da rede social Facebook, com os colegas da disciplina.
Inicialmente, decidimos assistir o filme Violação de Privacidade[1] (The Final Cut) para ser o ponto inicial das discussões e por ter uma relação "homem-máquina".
O filme, escrito e dirigido por Omar Naim e estrelado por Robin Williams em 2004, tem como tema central a implantação de microchips no cérebro de algumas pessoas e que registram todos os momentos de sua vida. Os chips – comercializados como Zoe Chips - são removidos após a morte do seu portador e as imagens editadas por um especialista – o editor. Esse profissional tem como responsabilidade editar as memórias e lembranças registradas no chip, visando a produção de um filme que será exibido durante a cerimônia do funeral. O personagem vivido por Robin Williams é um dos maiores especialistas nesse tipo de edição, selecionando imagens que tornam as memórias da pessoa falecida em histórias imaculadas, livres de pecados, dissabores, violências ou aspectos que poderiam denegrir suas imagens.
A partir do filme foram sugeridas algumas palavras-chave para os estudos, como: ciborg, chip, edição, subjetividade, representação, imagem, leitura, ética, público e privado. Estes conceitos podem ser vistos no portal Final Cut.
Analisando o filme, compreende-se que os conceitos de edição e editor ocupam uma posição importante e central nas reflexões em função da noção de ação associada a isso, pois é a partir da interpretação do editor e de seu olhar que se baseiam as escolhas feitas na sua leitura para a construção dos filmes retratando as memórias dos portadores dos chips. Da mesma forma, esse texto é construído a partir do olhar da autora que elegeu os conceitos “público e privado” que se integram na evolução do filme.
A partir da escolha dos conceitos de “público e privado”, foi realizada uma pesquisa bibliográfica centrada nestas palavras-chave, que foram analisadas a partir da narrativa do filme. O filme é um simulacro do que o homem pode idealizar em sua ação com a máquina. Assim, com o uso de tecnologias, como máquinas fotográficas, filmadoras, ou como propõe o filme, um chip implantado em uma pessoa, é possível saber todas as experiências vividas, sejam estas experiências boas ou não.
A ideia inicial do texto foi fazer uma reflexão sobre o conceito do que é público e privado e a sua relação com o conceito de privacidade no contexto das redes sociais. Estas reflexões foram feitas a partir de discussões em sala de aula e por meio da rede social Facebook, com os colegas da disciplina.
Inicialmente, decidimos assistir o filme Violação de Privacidade[1] (The Final Cut) para ser o ponto inicial das discussões e por ter uma relação "homem-máquina".
O filme, escrito e dirigido por Omar Naim e estrelado por Robin Williams em 2004, tem como tema central a implantação de microchips no cérebro de algumas pessoas e que registram todos os momentos de sua vida. Os chips – comercializados como Zoe Chips - são removidos após a morte do seu portador e as imagens editadas por um especialista – o editor. Esse profissional tem como responsabilidade editar as memórias e lembranças registradas no chip, visando a produção de um filme que será exibido durante a cerimônia do funeral. O personagem vivido por Robin Williams é um dos maiores especialistas nesse tipo de edição, selecionando imagens que tornam as memórias da pessoa falecida em histórias imaculadas, livres de pecados, dissabores, violências ou aspectos que poderiam denegrir suas imagens.
A partir do filme foram sugeridas algumas palavras-chave para os estudos, como: ciborg, chip, edição, subjetividade, representação, imagem, leitura, ética, público e privado. Estes conceitos podem ser vistos no portal Final Cut.
Analisando o filme, compreende-se que os conceitos de edição e editor ocupam uma posição importante e central nas reflexões em função da noção de ação associada a isso, pois é a partir da interpretação do editor e de seu olhar que se baseiam as escolhas feitas na sua leitura para a construção dos filmes retratando as memórias dos portadores dos chips. Da mesma forma, esse texto é construído a partir do olhar da autora que elegeu os conceitos “público e privado” que se integram na evolução do filme.
A partir da escolha dos conceitos de “público e privado”, foi realizada uma pesquisa bibliográfica centrada nestas palavras-chave, que foram analisadas a partir da narrativa do filme. O filme é um simulacro do que o homem pode idealizar em sua ação com a máquina. Assim, com o uso de tecnologias, como máquinas fotográficas, filmadoras, ou como propõe o filme, um chip implantado em uma pessoa, é possível saber todas as experiências vividas, sejam estas experiências boas ou não.
Com o objetivo de sistematizar as discussões, organizou-se
um mapa conceitual, utilizando o CmapTools (software livre de edição de mapas conceituais)
que foi o norteador para as reflexões em questão. A Figura 1 mostra este mapa conceitual com
todos os conceitos discutidos pelo grupo e apresenta a ideia de que a “edição
invade o que é público e privado”.
Figura 1 - Mapa conceitual relacionando os
conceitos encontrados no filme.
Isso nos leva a associar a viabilidade de um chip que
pode filmar ou gravar a vida “vivida”, sendo depois possível “construí-la” ou
“reconstruí-la” a partir do processo de edição realizado por uma pessoa
externa, como um exemplo do que Lévy (2009) propõe como movimento de
virtualização. O autor descreve esse movimento como o “Efeito Moebius, ou a
inversão entre externo e interno, privado e público, próprio e comum” (p.24-25].
Lévy (op cit) desmistifica a oposição entre o real e o virtual. Para ele, a virtualização
não se dá apenas dentro de máquinas computacionais. O virtual existe de forma
potencial, pois “quando uma pessoa, uma coletividade, um ato, uma informação se
virtualizam, eles se tornam ‘não-presentes’, se desterritorializam” (op cit,
p.21).
É nesse contexto que o filme nos aponta a possibilidade
de a vida de uma pessoa ser editada por um terceiro, sendo que essa edição
passa pela subjetividade do olhar do editor em sua “especialidade profissional”
que é selecionar e decidir o que será “publicado” da vida do outro no memorial
que está sob sua responsabilidade. Provocados por essa questão, o grupo de
colegas da disciplina, desenvolveu um trabalho colaborativo e cooperativo,
tecendo cada um a sua própria leitura sobre o filme com as respectivas áreas de
conhecimento, tendo-se assim um rizoma composto dos diferentes olhares dos
cinco integrantes do grupo.
Neste texto são discutidos
os conceitos de “público e privado”, relacionando-os com o conceito de
“privacidade” nas “redes sociais”, tendo como fundamentação teórica, os postulados
de Zygmunt Bauman.
A estrutura deste texto está organizada da seguinte forma:
- a Seção 2 apresenta uma
reflexão sobre o conceito de “redes sociais” no ciberespaço;
- a Seção 3 discute os conceitos de “público, privado e privacidade” nas redes sociais;
- a Seção 4 traz as considerações finais com o olhar da autora; e por último,
- as Referências Bibliográficas consultadas para a escrita do texto.
2. As Redes Sociais e o Ciberespaço
O
conceito de “redes” tem sido formulado em diferentes áreas do conhecimento a
partir de metáforas que lembram encadeamentos, interações, associações, vínculos
não lineares, todos envolvendo relações de comunicação de informações. Segundo
(Aguiar, 2007), os diversos padrões de formação de redes de indivíduos e grupos
sociais começaram a ser estudados a partir da década de 1940, sobretudo por
sociólogos, antropólogos e psicólogos sociais dos EUA, Inglaterra e Alemanha
(Barnes, 1972; Rogers e Kincaid, 1981; Scott, 1992; apud Aguiar, 2002), que utilizaram diferentes metáforas (malha,
trama, árvore, teia) para descrever os padrões de conexão e de fluxo de
informações entre os nós, até chegar à complexidade de um rizoma (Deleuze e Guattari,
1996, apud Aguiar, 2002).
No
Brasil, as redes sociais passaram a despertar interesse acadêmico nos anos
1990, nas pesquisas sobre novas formas associativas e organizativas que
emergiram dos processos de resistência à ditadura militar, de redemocratização
do país, de globalização da economia e de proposição do desenvolvimento
sustentável (Aguiar, 2006) e (Aguiar, 2007).
Para
(Marteleto, 2010), redes sociais é um conceito onipresente nos dias de hoje e
ocupa espaço crescente no discurso acadêmico, nas mídias, nas organizações ou
no senso comum. As redes sociais servem para dois fins. Primeiro, organizar o
espaço de comunicação e interação no mundo globalizado e interconectado, no
qual se produzem formas diferentes de ações coletivas, de expressão de
identidades, de conhecimentos e de informações. Segundo, mostrar mudanças no
modo de comunicação e interação entre as pessoas, na forma de como as pessoas
se socializam, se conhecem, como aprendem, escrevem e como forma de fonte do
conhecimento globalizado.
Nas ciências sociais, os estudos de redes
sociais permitiram a construção de uma compreensão inovadora da sociedade, que
ultrapassa os princípios tradicionais, nos quais o elo social é visto como algo
que se estabelece em função dos papéis instituídos e das funções que lhes
correspondem. De forma diferente, o conceito de redes sociais leva a uma
compreensão da sociedade a partir dos vínculos relacionais entre os indivíduos,
os quais reforçariam suas capacidades de atuação, compartilhamento,
aprendizagem, captação de recursos e mobilização (Aguiar, 2006).
Pode-se observar que as redes sociais representam as relações
entre pessoas, que podem estar interagindo por interesse próprio ou em nome de
uma instituição, mediadas ou não por computador. Observa-se, também que as redes
sociais são formadas com objetivos específicos, isto é, por pessoas que articulam
outras
pessoas em torno de interesses, projetos e objetivos comuns.
Uma
estrutura em rede – que é uma alternativa à estrutura piramidal – corresponde
também ao que seu próprio nome indica: seus integrantes se ligam
horizontalmente a todos os demais, diretamente ou através dos que os cercam. O
conjunto resultante é como uma malha de múltiplos fios, que pode se espalhar
indefinidamente para todos os lados, sem que nenhum dos seus nós possa ser
considerado principal ou central, nem representante dos demais. Não há um
“chefe”, o que há é uma vontade coletiva de realizar determinado objetivo.
(Whitaker, 1993 apud Aguiar, 2006).
2.1 Metáforas das Redes Sociais
Uma questão
fundamental na análise de redes é a forma como a informação flui entre os
integrantes destas redes e a força das interações entre eles, que têm sido
comumente representados por meio de quatro metáforas: árvore, malha ou trama, teia
e rizoma (Aguiar, 2006).
O conceito de
Rizoma foi a metáfora de redes escolhida por esta autora para ser comentada
neste texto. Segundo (Aguiar, 2006), o Rizoma é a metáfora que
tenta dar conta de uma multiplicidade de relações assimétricas de comunicação,
desencadeadas em vários pontos simultaneamente, e de fluxos descentralizados e
não-regulares de informação (no tempo e no espaço), nos quais não é possível
identificar um ponto “gerador” único. Um rizoma caracteriza-se pela
multidirecionalidade: o fluxo de informações pode partir de qualquer ponto, ou
de vários, e qualquer pessoa pode enviar mensagens para quem quiser, ou para
todos, simultaneamente; os papéis de emissor e receptor são intercambiáveis; e
a circulação de informação por toda a rede independe de uma instância central.
Caracteriza-se também pela heterogeneidade dos seus nós e vínculos: relações e
sentidos são estabelecidos de modos muito diversos, e o rompimento de um ponto
qualquer das cadeias de comunicação não compromete o reconhecimento do todo;
rupturas, “linhas de fuga” e mecanismos de auto-reorganização são próprios da
sua dinâmica. Um rizoma é tipicamente a configuração das conexões interpessoais
estabelecidas na vida cotidiana e via Internet. [...] Qualquer pessoa pode
contatar certos indivíduos e ignorar muitos outros; ou comunicar-se mais intensamente
com uns do que com outros; ou seja, pode manter vínculos fortes ou fracos,
recíprocos e não-recíprocos. Vínculos fortes podem ser intensos, duradouros; e vínculos
“fracos” não significam, necessariamente, comunicação menos eficaz ou menos
relevante.
Diferentemente
de “relações”, “parentescos”, “parcerias” e noções similares – que ressaltam o
engajamento mútuo ao mesmo tempo em que silenciosamente excluem ou omitem o seu
oposto, a falta de compromisso – uma “rede” serve de matriz tanto para conectar
quanto para desconectar; não é possível imaginá-la sem as duas possibilidades.
Na rede, elas são escolhas igualmente legítimas, gozam do mesmo status e têm
importância idêntica. Não faz sentido perguntar qual dessas atividades
complementares constitui “sua essência”.
A palavra “rede” sugere momentos nos quais “se está em contato”
intercalados por períodos de movimentação a esmo. Nela as conexões são
estabelecidas e cortadas por escolha. A hipótese de um relacionamento
“indesejável, mas impossível de romper” é o que torna “relacionar-se” a coisa
mais traiçoeira que se possa imaginar. Mas uma “conexão indesejável” é um
paradoxo. As conexões podem ser rompidas, e o são, muito antes que se comece a
detestá-las. (Bauman, 2004, p.12)
3. O Público e o Privado nas Redes
Sociais
A imagem (Figura 2)
selecionada do filme Violação de Privacidade (2004), para representar o “público
e o privado”, mostra o editor sendo agredido pela população após manifestações
contra os implantes de chip em bebês recém-nascidos, chamados de implantes Zoe.
Estas manifestações acontecem pelo fato de que o editor mascara a realidade,
selecionando apenas as imagens que ele considera como as mais adequadas,
politicamente corretas e felizes, para montar outro filme, que será mostrado às
pessoas presentes no cerimonial fúnebre, chamado de rememória.
Figura 2 - Imagem do
filme Violação de Privacidade (2004).
No contexto da obra cinematográfica
Violação da Privacidade (2004), a questão do que é público e do que é privado,
consiste em refletir sobre até que ponto o editor ou a própria família, tem o
direito de mostrar na esfera pública, parte da vida privada, até então
considerada como parte íntima do falecido. E, por que usar uma ferramenta de
edição para mostrar apenas o que é politicamente correto, bonito, feliz e
aceitável publicamente ?
No entanto, é importante questionar-se
sobre o que, realmente, é da ordem do privado. Sabe-se que o que é privado é
“algo” que pertence ao domínio da “privacidade” e, consequentemente, é tudo o
que não é público. Segundo o dicionário Aurélio, “privacidade” é a habilidade
de uma pessoa em controlar a exposição e a disponibilidade de informações
acerca de si. Relaciona-se com a capacidade de existir na sociedade de forma
anônima. No caso do filme em questão, o falecido não tem gerência sobre
as suas memórias, simplesmente pelo fato de que não tem o conhecimento de que é
portador de um implante Zoe, e assim sendo, não tem como gerenciar esta
situação, nem tão pouco, solicitar edições do filme da sua vida privada para
torná-la pública.
No contexto das redes sociais, amplamente
utilizadas pela nova geração, chamada de geração digital (Tapscott, 2010), a
questão do que é público e do que é privado, está em discussão no contexto
escolar, e preocupa pais e professores. Isto porque mais de 5 milhões de
estudantes brasileiros já pertencem a uma rede social na internet, como o Facebook ou o Twitter. As redes sociais na
internet fazem parte da vida da geração digital. No entanto, sabe-se que as
coisas têm o seu lado positivo e outro lado negativo.
O lado positivo é que, a participação ativa
nas redes sociais, está colaborando na preparação dessa geração para os
desafios da economia digital, que requer habilidades de pensamento
completamente diferentes das que eram necessárias na Era Industrial (Castells,
1999). O sociólogo polonês Zygmunt Bauman (Bauman, 2011a), também apresenta
reflexões importantes sobre o mundo pós-moderno e a condição social, na qual
estamos inseridos, e que tem referência com o fato de não vivermos mais na Era
Industrial e, estarmos vivendo na Era do Conhecimento:
O que aconteceu no século XX foi uma passagem de toda uma era da
história mundial, ou seja, da sociedade de produção para a sociedade de
consumo. Por outro lado, houve os processos de fragmentação da vida humana.
[...] No início deste século, as pessoas se preocupavam com o projeto de vida,
e em executá-lo, passo a passo. Nos dias atuais, isto não acontece, porque a
vida é dividida em episódios, fragmentados, o que não era assim no início do
século XX. As sociedades foram individualizadas. Em vez de se pensar em termos
de a qual comunidade se pertence, a qual nação se pertence, a qual movimento
político se pertence, etc., tentamos redefinir o significado de vida, o
propósito de vida, a felicidade na vida, para o que está acontecendo com a própria
pessoa, as questões da identidade que têm um papel importante hoje, no mundo. A
pessoa tem que criar a sua própria identidade. A pessoa não a herda. Não apenas
é necessário fazer isso desde o início da vida, mas é necessário passar a vida
de fato, redefinindo a própria identidade. [...] Muitas mudanças, não apenas a
passagem do totalitarismo para a democracia, mas muitas outras coisas mudaram
(Bauman, 2011a).
Desde as últimas décadas do século XX,
estamos assistindo a diversas, rápidas, amplas e profundas transformações
sociais, econômicas, culturais em âmbito mundial. Nos textos desenvolvidos por
Bauman (2001, 2004, 2010, 2011, 2011a), estamos passando do que o autor chama
de “modernidade sólida” para a “modernidade líquida”. A modernidade sólida, segundo
ele, derretia os sólidos para colocar outros melhores em seus lugares. Essas
substituições terminariam quando os sólidos ali substituídos não tivessem mais
problemas, atingindo assim a perfeição. A modernidade líquida derreteu tudo o
que era ou parecia ser sólido, mas não coloca outro sólido em seu lugar. Assim,
tem-se a constante mudança, num processo que não tem previsão de terminar. A
impermanência das coisas, torna-se a única constante da modernidade
líquida.
“Os sólidos suprimem o tempo; para os
líquidos, ao contrário, o tempo é que importa” (Bauman, 2001, p.8 apud Veiga-Neto, 2009). As ideias de
Bauman nos proporcionam subsídios para compreendermos, em parte, as mudanças
sociais que vivemos nas últimas décadas. Estas mudanças aconteceram de forma
muito rápida e com tal profundidade num amplo conjunto de práticas da sociedade
pós-moderna. Tais práticas envolvem conhecimentos em diversas áreas: cultura,
economia, política, ética, estética, educação, entre outras.
Considerando as ideias apresentadas por
Bauman, na área da educação, o lado negativo de todas estas mudanças é a
exposição da vida privada da geração digital, nas redes sociais, por meio de
fotos, comentários, vídeos, entre outros, completamente sem critérios. Nesse
sentido, a preocupação de pais e professores está relacionada ao “o que” os
estudantes compartilham nas redes sociais, que muitas vezes são informações do
âmbito privado que estão sendo disponibilizadas na esfera pública, sem critério
algum.
A discussão em torno dos conceitos do que é
“público e privado” é importante, e também relevante, quando percebe-se que a
sociedade pós-moderna, na qual estamos inseridos, vive o momento da modernidade
líquida (Bauman, 2010), onde tudo é passageiro, efêmero e muda de forma rápida,
sob a menor pressão. Na verdade, a geração digital é incapaz de manter a mesma
forma por muito tempo. Então, o que hoje é privado amanhã passa a ser público e
vice e versa. Mas como decidir o que pode tornar-se público ou o que deve
manter-se privado ? O impulso para transgredir, substituir, trocar, acelerar,
não permite a solidificação das coisas.
Outra preocupação dos educadores, tem
relação com o chamado “enfraquecimento das relações humanas” (Bauman, 2004),
quando observa-se que a quantidade de amigos nas redes sociais aumenta a cada
dia. No entanto, da mesma forma que esse número aumenta, também ficou mais
fácil e rápido “excluir” um amigo desta rede que já não é mais tão querido.
Pode-se observar que, as escolas que estão
aderindo ao uso das redes sociais, têm preferência pelo uso do microblog Twitter, simplesmente pelo fato
de preservar, ao menos em parte, a “privacidade” dos estudantes. Outra
preocupação pertinente no uso das redes sociais, é de ordem pedagógica, no que
diz respeito ao tipo de “linguagem” que os estudantes tendem a usar na rede,
bem distante da norma culta. Não é fácil estimulá-los a empregar o bom
português nesse contexto, mas é importante que pais e professores estejam
atentos lembrando sempre a importância da “linguagem” escrita de forma correta,
mesmo nas redes sociais.
Levando em conta que o grau de exposição da
informação privada depende de como o público receberá tal informação, o que
varia segundo lugares e épocas, o esforço para manter um assunto privado e a
decisão de torná-lo público são objetivos antagônicos. As definições de
privacidade e publicidade se opõem. Privado e público são conceitos antagônicos
(Bauman, 2011. p. 35-38). Em geral, seus campos semânticos não estão separados
por limites que permitam o tráfego de mão dupla, mas por fronteiras demarcadas:
linhas intransponíveis, de preferência fechadas com rigidez e pesadamente
fortificadas de ambos os lados para impedir transgressões, isto é, que se evite
passar da esfera pública para a esfera privada com muita facilidade. Parece-nos
que a crise atual da privacidade está bastante ligada ao enfraquecimento, à
desintegração e à decadência de todas as relações humanas. Nesse processo, é
muito difícil perceber quem veio antes, se a crise atual da privacidade ou a
desintegração das relações humanas.
3. Considerações Finais
As redes sociais têm sido amplamente utilizadas entre a
geração digital. Estas ferramentas de comunicação aproximam as pessoas,
inicialmente, motivadas pela diversão, compartilhamento de fotos e mensagens.
No entanto, constata-se que o uso das redes sociais na educação tem benefícios
que podem ser observados em pesquisas científicas e trabalhos acadêmicos.
Muitas escolas já usam as redes sociais e criam sites
próprios para conectar estudantes e professores. No entanto, as redes sociais costumam
ser consideradas inimigas dos estudos por muitas pessoas. Por outro lado, as escolas
estão usando-as como aliadas na preparação dos estudantes e na comunicação
entre a comunidade acadêmica.
Toda mudança de comportamento na sociedade tem os seus prós
e contras. Da mesma forma que aproxima, facilita e agiliza a comunicação entre
os estudantes, educadores e amigos, as redes sociais também são utilizadas
indiscriminadamente, principalmente, pelos jovens que pertencem à chamada
geração digital.
Observa-se que estes jovens não se preocupam com o
conteúdo das mensagens nas redes sociais, e também, da mesma forma que com
muita facilidade adicionam “milhares” de amigos aos seus perfis, a exclusão dos
amigos já não mais queridos, é feita com mais facilidade ainda.
Isso faz-nos pensar no momento histórico em que estamos
vivendo, onde tudo é descartável em nossas vidas, desde objetos, pessoas,
instituições, caracterizando a liquidez da sociedade pós-moderna.
Outro ponto importante a ser
considerado é a exposição dos jovens nas redes sociais, feita muitas vezes, sem
critério algum do que pode ser compartilhado, ou não. Por isso, é muito
importante, que pais e educadores, orientem estes jovens para o uso criterioso
das redes sociais, a fim de protegê-los desta exposição inadequada nas redes, e
também para auxiliá-los a fazer o uso pedagógico destas ferramentas. Outro
ponto contra das redes sociais, é o uso indevido destas redes pela imprensa
sensacionalista que publica fotos e informações privadas de pessoas públicas,
as chamadas celebridades. Isto mostra uma preocupação a ser considerada no
momento em que informações do âmbito privado se transformam em público e
notório. Tudo isso, acontece pela má utilização da internet e das redes
sociais.
Inevitavelmente, tudo gira em torno da devida
conscientização da geração digital para o uso adequado das novas tecnologias. Essa
questão da conscientização não se resume ao fato de “os fins justificarem os
meios”, como afirmava Maquiavel no seu livro intitulado O Príncipe, mas na
construção de uma consciência para o uso desses meios de comunicação.
Daí, temos algumas questões para
se pensar: “Como decidir entre o que é público e/ou privado?”, e “Como utilizar
as redes sociais de forma que não prejudique a mim e aos outros ?”
O filme Violação de
Privacidade (2004) foi o ponto inicial para a escrita deste artigo, que desencadeou
as discussões que surgiram posteriormente, em relação aos conceitos do que é
público e privado, do que podemos ou não, se temos o direito de publicar dados,
fotos e informações de outrem sem o consentimento do mesmo.
Responder a estas questões não
foi o objetivo principal deste artigo, mas colocar-nos a pensar sobre as mesmas
e de que forma, orientaremos nossos filhos e estudantes, no processo de
construção do conhecimento com o uso das tecnologias de forma segura e
coerente.
Para a finalização deste texto, foram
consultados diversos textos, de vários autores relacionados nas referências bibliográficas
e nas aulas das disciplinas.
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